À Minha Sobrinha Maria Inês

(sem lirismos nem peneiras)

Desvelos da primeira infância

Antes de conheceres a luz do dia, os teus pais tinham permitido que eu escolhesse o nome para a minha primeira e única sobrinha. Propus Inês, já que seria esse o nome escolhido se o João tivesse nascido uma menina…Um nome que simbolicamente estava associado a alguém frágil, casto, calmo, mas independente…

Nasceste em janeiro, mês de noites gélidas e de dias curtos e sombrios, propícios à calma e ao aconchego…

No entanto, a tua chegada trouxe um grande vigor e, acima de tudo, energia a toda a família…

Quando te vi pela primeira vez, eras um “feijãozinho” bem pequenino e tranquilo, que se acomodava facilmente ao colo…

Fiquei enternecida, cheia de esmeros e de devaneios para a primeira menina da família!

Achei que, finalmente, iria poder usufruir de um contacto mais direto com o mundo feminino de folhos e lacinhos…

Longe estava de conhecer a tua resistência e determinação…

Momentos jocosos…

Recordo que, logo nessa primavera, comecei a dar-me conta da firmeza do teu caráter!!

Eu e a avó Bé transpirávamos para te colocar na cadeira e para apertar o cinto, quando te trazia no carro para casa da avó Cecília. Era uma missão impossível!!!

Depois aí, era um contínuo abrir de goelas para comer a sopa, até que eu te arrancava das mãos pacientes da avó…

Fazer a sesta depois de almoço? Impensável!!! Só com o embalar de um automóvel em movimento…

Tentar que adormecesses ao colo, quando os teus pais te deixaram comigo? Uma catástrofe vergonhosa!!! Isto porque toda a gente julgava que te estava a matar, tal era a força dos gritos. Ao contrário das outras crianças, só conciliavas o sono quando estavas encostada à mãe. na vertical. Enfim, adormeceste de cansaço e depois de eu te ter sacudido ininterruptamente e ter suado às estopinhas…

Eras já uma menina obstinada que sabia bem o que queria…

A minha tentativa de fazer de ti uma “boneca” ficou defraudada! Não gostavas do cabelo com totós, nem de laçarotes, muito menos de cor-de-rosa.

(- Detesto cor-de-rosa!!).

Preferias jogar futebol com os rapazes do colégio e era habitual ver-te no meio deles a esgrimir-te com a bola…

Depois vieram os combates de Wrestling com o João e o avô Sérgio!

(- Sabes, papá, hoje o avô magoou-se, porque deu com a cabeça na parede!!!)

…mentira, a minha sobrinha tinha atingido o avó na testa com um carrinho!

Quando ficávamos no Castedo, eram os jogos de damas ou de xadrez, em que ninguém gostava de perder. Havia outras brincadeiras no ringue, onde as sapatilhas novas iam diretas para a máquina de lavar…

Nessa altura, revelavam-se algumas das tuas preferências ou receios…

(- Tia, eu quero enroladinhos com SAUCHICHA!!!)

(- Ai, ai, está ali um cão!!!)

E era ver a Inês, pernas para que te quero, a correr, desenfreadamente, na estação dos caminhos de ferro do Tua, a fugir de um pobre cachorro, deixando a mala de rodinhas a escorregar pelo passeio abaixo…

Subtilezas….

E eu sorria interiormente, ao ouvir as tuas descobertas em relação à gulodice do avô que, fora de casa, gostava de um bom petisco de veado ou de escabeche de enguias no “Calça Curta”.

(-Tia, já almoçamos às onze horas, em casa da avó! Vamos almoçar outra vez?)

Sorria ainda mais com outras tiradas…

(- Inês, vais cair, se não ficas quieta!

- Olha, agora tens poderes para adivinhar o futuro?!!!)

O tempo da escola veio estabelecer horários e regras. Tornaste-te uma aluna aplicada, responsável e autónoma, ciente do cumprimento das tuas tarefas, mas atenta às situações mais ou menos hilariantes…

Os primos eram sócios de conversas e brincadeiras…A ternura pela Conchinha e pelo Manuel revelaram uma outra faceta, por vezes, pouco evidente nas investidas contra o Diogo…

Passaram alguns anos e apercebi-me que a minha sobrinha crescera muito rapidamente. Frequenta o ensino secundário, com um excelente desempenho e gosta de intervir nas conversas “dos adultos”, de forma assertiva… Tornou-se uma jovem com ideias próprias e com a mesma determinação de criança….

Prólogo de uma nova etapa…

Nesta data especial, quero expressar os meus votos de que continues a percorrer, em conformidade com as tuas escolhas, um caminho de sucesso e, especialmente, de muitas alegrias.

Também gostava que encontrasses, nos livros e na literatura, o conforto para os momentos mais sofridos, e que descobrisses, na escrita, um meio de nunca esqueceres quem és…

 

Um beijinho muito especial

da tia Lizete

 

Dia do Crisma-Porto, 05 de setembro de 2020

 

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